segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

O Sertão tem duas almas


Só quem conhece o sertão sabe os mistérios que ele tem. Costumo dizer que o sertão tem duas almas – uma cinza e outra verde.
Durante o verão, o sertanejo tem uma visão acinzentada da caatinga, que como um triste véu cobre o sertão de ponta a ponta, apenas pontilhada por algum escasso verde: um mandacaru aqui, uma juazeiro acolá, uma oiticica ao longe... o resto, quase tudo é morto. Até no próprio céu apenas um ou outro urubu voa fazendo curva, como se não tivesse muito o que fazer. A paisagem é triste, e algum desavisado que passar por ali sente pena do próprio chão, esturricado, sem vida, só poeira e pedra.
Mas o sertão tem outra alma, uma alma viva, verde, que encanta e emociona, até. Mas essa alma só surge quando a chuva cai, quando o inverno chega. Poucas chuvas depois e um tapete verde se forma sobre a terra; as folhas da jurema começam a brotar; o sabiá refloresce; o marmeleiro e o mufumbo despontam, e tudo fica verde novamente. É aí que se percebe que o sertão não morre, ele apenas dorme para acordar mais belo.
Os riachos cantam, as cachoeiras roncam, as grotas murmuram, e a água espalha vida por onde passa. Os periquitos gritam, o galo-de-campina solta o seu canto e o sabiá comanda a sinfonia pela caatinga afora. O tejo surge nos terreiros de casa em busca de pintos, ou ovos; a nambu canta debaixo das moitas; a siricora grita no galho da oiticica; o caburé canta no oco; o tatu fuça na baixa... o sertão vira poesia.
Só quem conhece o sertão sabe o quanto ele é belo! E beleza não se escreve, nem se descreve. Portanto, caro leitor, por mais que eu tente explicar o sertão para alguém que nunca o viu, jamais entenderá o que digo, mas se você conhece o sertão, essas palavras já são o suficiente; não para lhe dizer o que é o sertão, pois você já o conhece, mas para dizer o quanto, nós, sertanejos, estamos felizes, pois o inverno chegou. E com ele a alegria.

João Rodrigues




Um comentário:

  1. É sempre muito bom ler algo sobre a terra da gente, sobretudo da forma como você descreve - NOTA 10.

    Zezinho Cardoso

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